domingo, 10 de janeiro de 2016

V

Johanna está sentada no sofá com um copo de Whiskey nas mãos. A kitty deitada a seu lado olha-a com um ar sonolento. Bebe um golo e suspira. Só o corpo está ali, a mente está anos atrás…

- Johanna a minha mãe morreu, nada me prende aqui…
- … então e eu?
- Tu?...
- Sim eu… não entro nessa equação?
- … não…
- Pedro!...
- … adeus Johanna.

Johanna olha-o enquanto Pedro se afasta. O carro arranca e apenas o som da chuva que martiriza o pano do chapéu se ouve. No fundo sabia que este dia chegaria, esta vida era demasiado “normal” para ele. Não devia ter-se deixado encantar por aquele homem. Desde de que o vira que os seus instintos a tinham avisado disso e mesmo assim não resistira. Havia algo nele que o tornava irresistível embora não soubesse dizer o quê, se lhe perguntassem.

O telefone toca. Não faz menção de atender. O telefone deixa de tocar. Não se interessa em ver quem era. Continua absorvida nas memórias. Bebe mais um golo.

- Johanna, o que se passa?
- Pedro…
- Sim, o que se passa?
- …nada mas…
-  Johanna, deite-te este número em caso de necessidade. Não me faças arrepender-me de o ter feito.
- Desculpa… queria ouvir a tua voz…
- Johanna, pensei que tinha deixado bem claro que entre nós apenas há a dívida de gratidão por teres salvo a minha mãe. Honrarei a palavra dada, por isso te dei este número… não foi para ouvires a minha voz.
- …
- … não chores… mas tens de perceber que na minha vida não há lugar para romance. Cuida-te!


Bebe o resto do whiskey de um trago. O copo escorrega por entre as suas mãos e cai no tapete enquanto as lágrimas escorrem por suas faces.


Move-se como uma sombra na noite, parece que desliza… numa esquina um homem bate numa mulher. Ela encolhe-se e protege a cara à espera do próximo golpe que parece tardar mais do que esperava. A medo baixa um braço e com surpresa constata que o agressor já não está à frente dela. Olha em volta tentando perceber como pode ter desaparecido e para onde…
Num beco escuro não muito longe o homem que há momentos tinha os olhos raiados de sangue enquanto batia selvaticamente na mulher, que ainda não percebeu como ele desapareceu, agora tem o olhar parado. Observa um vulto negro que tem à frente sem perceber onde está e como foi ali parar. Numa sequência de movimentos quase imperceptível para este homem, o vulto de preto envia quatro kunai (espécie de punhais ninja) que lhe acertam, dois nos ombros e dois na cintura, fixando-o firmemente à porta de madeira maciça atrás de si. A dor que sente é grande mas o medo é maior pelo que não chega a gritar. O vulto de negro aplica, num movimento rápido, um golpe na traqueia do homem. Só se apercebe que deixou de conseguir falar quando, instantes depois, se vê impossibilitado de gritar, como pretendia, em resposta ao gesto que o vulto à sua frente acabara de fazer – abanou o indicador da mão direita para a direita e para a esquerda e terminou com o polegar para baixo.
A última coisa que sente é o golpe na jugular feito pelo wakizashi (sabre japonês de pequenas dimensões) empunhado por aquele vulto, que o fez acabar de se esvair em sangue…
O vulto de preto recolhe os kunai, lança um spray sobre o corpo e desaparece nas sombras.


Johanna chega à secretária e tem um bilhete de Martinho:

“O Dr. Fernandes chamou-nos, quando chegares vai lá ter ;)“

Volta vestir o casaco que despira e dirige-se para a porta.

- Bom dia Dr. Fernandes. Martinho.
- Bom dia Miss McGill.
- Johanna.
- E então o que nos pode dizer Dr. Fernandes?
- … bem, como dizia aqui ao detective Fonseca. Para começar posso dizer que este desgraçado não parece ter ficado com um único osso inteiro da sova que terá levado.
- Encontrou marcas que indiquem se foi empregue alguma arma?
- Não é fácil afirmar. A maioria das marcas aparentam ter sido provocadas com as mãos. Uma ou outra marca poderia ter sido causada por um bastão ou uma soqueira. A marca mais curiosa que encontrei é um padrão geométrico na face esquerda. Tenho a sensação de já o ter visto antes mas a minha memória já não é o que era.
- É este? (Johanna retirara um foto do bolso e mostrava-a ao Dr. Fernandes)
- Esse mesmo!
- E que mais? As mãos e os pés, como foram cortados?
- Mãos e pés foram amputados post-mortem recorrendo a uma lâmina afiada. Não tendo ambos os lados é difícil especificar qual o objecto empregue mas diria que nos quatro casos a amputação foi feita num só golpe.
- Causa da morte?
- O golpe no nariz que o afundou crânio dentro.
- Conseguiu identifica-lo?
- Infelizmente ainda não. Sem as mais e os dentes que foram todos removidos resta-nos esperar pelo teste de ADN, para ver se por acaso está no sitema.
- Mais alguma coisa?
- Apenas mencionar que a marca com o padrão geométrico, que parecia já estar à espera que encontrasse, terá sido feita post-mortem como as aputações. Os resultados das análises toxicológicas estarão no meu relatório. O teste de ADN demorará mais uma semana.
- Ok, obrigada Dr. Fernandes.
- Obrigado Dr. Fernandes.
- Detectives…



(continua)


FATifer

12 comentários:

  1. Já há espera do próximo...
    ...e o domingo está propicio para a escrita :)
    Bjs
    BM

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    1. BM,

      O próximo já está meio “amanhado” mas esta tarde não me parece que escreva grande coisa… terás de ter paciência (não se pode apressar o génio!) ;)

      Beijinhos e bom resto de Domingo,
      FATifer

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  2. Caramba!! Estou sem palavras!

    Isto ultrapassa todas as minhas expectativas, FAT!

    Muita emoção. Muita violência...Sentimental, como sou, já fiquei imensamente triste com a atitude fria e distante do Pedro em relação à tentativa de aproximação da Joana. ( tu e a tua paixão pela Língua de Shakespeare :) )
    Sustive a respiração enquanto lia a passagem do vulto de negro que, qual justiceiro, punia sem dó nem piedade, o agressor da mulher.

    Vou aguardar com calma e talvez com a toma de um calmante!

    Tens razão na resposta dada à comentadora anterior: Os génios não podem ser apressados. Há que deixar a inspiração fluir...E a tua é um prodígio vertiginoso! Ufa!



    Bom resto de Domingo! :)


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    1. Janita,

      Não vou esconder que o teu comentário me deixa com um sorriso de orelha a orelha!
      Fico muito contente de conseguir surpreender-te. A referência ao “génio” era a brincar… acho que até tenho algum jeito para escrever mas acima de tudo faço-o porque me dá prazer. Se quem lê também gosta mais contente fico. :)

      Beijinhos e bom resto de Domingo para ti também,
      FATifer

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  3. Lido, primeiro a correr, depois já mais caminha
    venha o próximo, ó (eu)génio

    eheheh

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    1. noname,

      … o próximo está “in process”…
      “(eu)génio” parece-me bem! :) … se não tivesse nick adoptava este ;)
      (sempre é melhor que ambrósio) :)

      Beijinho e boa semana,
      FATifer

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  4. Lidos 2 de rahjada e à espera de mais...

    :)

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    1. Meu amigo,

      É curioso ver-te no papel de leitor a “pedir mais”, para variar ;)

      É já a seguir!

      Grande abraço,
      FATifer

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    1. Um comentário de sua excelência o Rafeiro!

      Se a única “crítica” que tens é ao nome da gata, quer dizer que isto até está a correr bem (sim, porque não és pessoa de deixar de dizer o que pensas! :P )

      :)

      Grande abraço,
      FATifer

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  6. Olá, FAT.

    Deves de estar agarrado à escrita!:)

    Vim até ao teu cantinho e cabo de 'descobrir' que tiveste a feliz ideia de colocar no topo da barra lateral, os contos que já publicaste.
    Óptimo! Assim, poderemos aceder facilmente a elas. Já comecei a ler...:)

    Boa semana e boa escrita. :)

    Beijinhos

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    1. Janita,

      Coloquei esse link para mais fácil acesso sim mas em particular a esta história - para quem chegue a meio. Já te enviei os outros em pdf, por ser mais cómodo de ler, mas se preferes ler assim no blog, dá uso aos links! ;)

      Beijinhos,
      FATifer

      PS – hoje ainda não escrevi nada mas já vou publicar o próximo que já estava escrito ontem! ;)

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