Até ler este achava que “O Ensaio Sobre a
Cegueira” era o mais cinemático dos livros do autor e o facto é que foi
adaptado ao cinema. Não estranho o facto deste livro que acabei de ler, também
já o ter sido e estou curioso para ver o filme. No caso do “O Ensaio Sobre a
Cegueira” acho que o filme está à altura do livro, espero que neste também seja
assim, porque do livro gostei bastante!
Deixo-vos umas breves passagens porque
desta vez estava um pouco preguiçoso de apontar…
“…as palavras, ao passar, deixam sempre
ficar borras, para saber o que de facto nos tinham querido comunicar há que
analisar essa borras minuciosamente.”
“Ao contrário do que em geral se pensa, tomar
uma decisão é uma das decisões mais fáceis deste mundo, como cabalmente se demonstra
pelo facto de não fazermos mais que multiplica-las ao longo de todo o santíssimo
dia, porém, e aí é que esbarramos com o busílis da questão, elas sempre nos vêm
a posteriori com os seus problemazinhos particulares, ou, para que fiquemos a
entender-nos, com os seus rabos por esfolar, sendo o primeiro deles o nosso grau
de capacidade para mantê-las e o segundo o nosso grau de vontade para
realizá-las.”
“… chegou-lhes um fósforo aceso e ficou a
olhar o rápido trabalho do fogo, a labareda que ia mastigando e engolindo os
papéis e logo os vomitava feitos em cinza, as rápidas cintilações que teimavam em
mordê-los quando a chama, aqui e além, parecia ter-se extinguido.”
“… e as palavras que dizia desciam sobre o
corpo do homem aflito com uma chuva fina, dessas que nos tocam a pela como uma carícia,
como um beijo de água.”
“A alma humana é uma caixa donde sempre pode
saltar um palhaço a fazer caretas e a deitar-nos a língua de fora, mas há
ocasiões em que esse mesmo palhaço se limita a olhar-nos por cima da borda da
caixa, e se vê que, por acidente, estamos procedendo segundo o que é justo e
honesto, acena apavoradamente com a cabeça e desaparece a pensar que ainda não
somos um caso perdido.”
FATifer